“Uma manhã de Inverno, paralisado por um
sobretudo, arfando
com o peso de uma pasta de amostras, vejo-me
a subir
uns degraus de ferro das fábricas Werkspoor, pelo lado de fora,
entenda-se, trinta metros acima da água dum
canal, com a ajuda
de mão e meia, seguindo um contramestre que
me queria
mostrar uns buracos no telhado.
Tinha começado a minha aventura com o
revestimento de
asfalto líquido para telhados, que durante
dois anos me iria levar
a cruzar a Holanda em quase todos os sentidos
e a pôr em
contacto com uma espécie de gente difícil de
igualar: a da construção.
Atanazado pela pobreza, acossado pelo fisco
que me pretendia
rico e me apresentava intimações de
milionário — o recebedor
das Finanças a recomendar-me que entregasse a
minha defesa
a um consultor fiscal, eu que mal teria
dinheiro para mandar
tocar um cego, se os cegos aqui precisassem
de tocar — aceitara
o primeiro emprego em que me tinham aceitado.
Além da tal pasta de amostras já referida,
recebera um manual
do perfeito vendedor onde, entre outras
coisas e à laia de
estímulo, se recomendava considerar que os
telhados, expostos
às intempéries, necessitam de reparações
anuais, mensais, semanais!
E que cada buraco causado por cada pedra de
granizo
era um ganho potencial. Ocupado em cálculos —
eu, que ainda
conto pelos dedos — parava-me abismado diante
da Centraal
Station de
Amsterdam, sonhando quanto se poderia ganhar
com um telhado gigantesco como aquele.”
In Com os holandeses, pág. 25
Hoje o acaso fez-me encontrar prova de que durante dois
anos consegui ganhar para o comer e um pouco mais:
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