Vamos lá então meter o nariz onde por pressuposto não sou chamado, e que a
sisuda maioria provavelmente acha impróprio para a minha idade. Por sorte é
essa uma questão do foro privado, e aqui só se tocará em generalidades, dois
fenómenos apenas, mas que singularmente concorrem para a poluição mental dos
meus dias: o sorriso e o sexo.
Tornou-se-me um
reflexo automático: se na televisão começam aquelas bonecas loiras e
arranjadinhas a sorrir para o boião de creme, o desinfectante da sanita, o
caldo Knorr? Desligo. Político ou comentador a arreganhar os dentes? Desligo.
Evento, concurso, a multidão aos vivas e a sorrir? Desligo. Entrevista às
gargalhadas? Idem.
Com o sexo a
dança é a mesma, maior ainda a ubiquidade. Explicações, estatísticas, cursos,
workshops, sonhos, recalques, fetichismos,
sadomasoquismos, sombras de Grey, pederastias, incestos, bestialidades,
trios, quartetos, swings, orgias…
Com filmes,
televisão e internet, a oferta excede de tão longe a procura que nem se pode
dizer, como nas lojas de antigamente, que é à vontade do freguês. Mulher ou
homem, mesmo superdotado nos atributos, com tempo de sobra e resistência de
mulo, passaria o século sem esgotar as
possibilidades do que lhe oferecem.
De modo que,
caído o sorriso e o sexo em extrema banalização, resta a pergunta se compensa
sorrir e copular. Responda cada um por si, mas acerca da cópula talvez valha a
pena dizer que, embora nem todos se dêem conta, é dos inesquecíveis momentos em
que um casal verdadeiramente pode comungar.
O sorriso pouco
importa, banalizar o sexo deveria ser crime.
PS. Isto foi
escrito oito anos atrás, mas ao lê-lo agora parece-me do começo do século
passado.