quinta-feira, março 31

The Moscow Times

 

É independente, é livre (por enquanto), semanas atrás a redacção refugiou-se em Amesterdão. Merece apoio.

quarta-feira, março 30

Voltas do mundo

Cá estamos então de volta e note-se para a estatísca: ao longo de 58 anos (desde 1964) foram agora percorridos pela 232ª vez os 2.200 km entre Amsterdam e Estevais de Mogadouro, o que  mais coisa menos coisa dá 510.400 km. Usaram-se 5 carros Ford, 1 Renault, 1 Citroën e 1 Opel. Avarias zero. 1 pneu rebentado, 3 furos, 4 multas por excesso de velocidade em França e em Espanha (cerca de 150 euros).

Uma surpresa.

Se não há lugar no “nosso” hotel em Magaz de Pisuerga, passamos a última noite no parador de Tordesillas. Assim foi desta vez. Só que ao entrar na cidadezinha nos supreendeu um cartaz a anunciar 30 km de velocidade máxima. E então é preciso ver para crer, porque dá impressão de um filme em slow motion, pois como o trânsito se move a passo de boi quase não faz contraste com o andamento das pessoas, o que cria a ilusão de que elas quase se arrastam em vez de caminhar. 

Uma antevisão do que vos espera, porque me despedirei antes da chegada do maravilhoso mundo novo.

 

domingo, março 27

O Casanova

 

Poderá um galo tornar crítico um agravo doméstico? E esse tão penoso que leve um casal de meia idade a reconsiderar o que sente? No caso de Elvira e de Daniel pode, tanto mais por serem contrários no temperamento: ela expansiva e calorosa, ele frio, reservado que nem um sueco.  

O quintal é espaçoso, há ali fruta, flores, horta, uma capoeira enorme, onde os antigos proprietários tinham umas cinquenta galinhas e ainda mais coelhos. Para eles, contudo, aquilo dava um trabalhão, pelo que se tinham desfeito da bicharada, deixando as galinhas precisas para os ovos e uma cabidela de vez em quando.  

Meses depois o galo começou a ficar morrinhento, e apareceu morto. Saudades não deixava, tinha um cacarejo de constipado e galava mal, as galinhas punham uns ovitos de perdiz.

Veio então um, que ao vê-lo os deixou de boca aberta, pois das garras à crista o bicho era espectacular, até no cocoricó se mostrava um galo de alto lá.

Elvira cuidava da capoeira, mas nessa manhã, por ser o saco da ração pesado demais, tinham-no levado ambos, foi assim que pela primeira vez Daniel viu como o “Casanova” tratava o seu harem. Nada de cantorias, rodeios, asa a arrastar: ao vê-lo perto já elas se agachavam, dois, três segundos passava à seguinte, bruto com algumas e quase as esmagando

Ambos a olhar calados, fingindo que não viam nem o espectáculo os interessava, e logo depois, cada um por seu lado voltaram a casa.

Acabavam de almoçar, quando Daniel reparou que Elvira hesitava, mas só mais tarde, já a arrumar as xícaras, os olhos baixos de quem se assusta da ousadia, conseguiu dizer:

- Não podemos continuar assim. Sou muito infeliz.

Com o modo sarcástico que os seus alunos temiam, Daniel pareceu hesitar, recompôs-se, a voz quase amistosa: - Infelizes somos todos, Elvira. Todos.

sexta-feira, março 25

"Volto já"

A partir de hoje, e talvez durante uma semana, este blog vai ficar inactivo. No domingo, contudo, será publicada a crónica do Correio da Manhã.

quinta-feira, março 24

Nasceu assim



 (Clique)

quarta-feira, março 23

Umbigos

 

É gente que vive num antigamente que nunca foi como o idealizam, e vem apontar o dedo aos jovens escritores que não se mostram revoltados com a crise do país e parecem desafeitos da política.

Acenam então com os "grandes nomes" das décadas de 50 e 60, e eu, triste de mim, que os conheci, testemunhei as vaidadezinhas, as cumplicidades, os medos, recordo entre outros aquele grande escritor esquerdista que ganhava rios de dinheiro com a publicidade capitalista e salazarista, mas se queixava, amargo, lamuriando "nunca me deixaram escrever o que queria."

Quem raio o proibia de fazê-lo?

Podem censurar os jovens escritores pelo desinteresse que mostram pela política e a sociedade, e o muito tempo que usam a inspecionar o próprio umbigo e adjacências, mas dêem-lhes exemplos mais nobres do que os senhores escritores que foram da "Oposição", orgulhosos "lutadores antifascistas" – tê-lo-ão sido tanto como gritaram?  - e sofriam quando a Censura não lhes proibia os livros, porque era isso que dava fama e proveito, o rótulo de mártir.