Não está na moda nem nas conveniências, raro está, abrir os olhos e dizer em voz alta que o rei vai nu. Mas bem era que se gritasse, porque já não é só o rei: a rainha, as princesas, as açafatas, os anões, os bobos... A corte inteira vai em pêlo.
Simplesmente, o nosso tempo é de gentilezas, e tudo são salamaleques, reverências, cumprimentos, abraços a este, palmas àquele.
Quando gente que considero me fez a recomendação, corri ao sítio, e li aqui que o melhor livro de ficção publicado em
Portugal no século XX é A Ilustre Casa de Ramires e depois aqui que Para Sempre, de Vergílio Ferreira, é o
melhor livro de ficção portuguesa do século XX.
Entre outras fortes e fundadas razões porque “Para Sempre...(é
a)“escrita do limite no limite da escrita, articula a unidade e a totalidade, e
portanto o efeito de harmonia, o estado de perfeição e de acabamento, com a
vertigem da imperfeição e a força fragmentária de um discurso que exprime a
tomada de consciência do terrível. Belo e Sublime, portanto, Para Sempre
é um romance que atinge os princípios estéticos mais antigos no centro
nevrálgico da própria Modernidade, que não convive bem — como sabemos — com
categorias apriorísticas”.
Como sempre, saltam os eleitos do abc para a licenciatura, dela para o
mestrado, o doutoramento, a cátedra, e quando finalmente se sentam nessa nuvem
falam dum modo e com umas certezas que, pelo menos a mim, se me descaem os
queixos.
Andei uns dias a perguntar-me se não seria inveja minha. Acho que é. Quem me
dera saber como se atingem os princípios estéticos mais antigos no centro
nevrálgico da própria Modernidade, e descobrir as razões que leva esta a
embirrar com categorias apriorísticas. Talvez então me fosse dado escrever o
melhor livro de ficção do século XXI.