Deo gratias, até à data a minha
memória funciona sem que dela tenha razão para me preocupar, pois mostra-se
pronta a fornecer os dados, os nomes, as vivências e as recordações que lhe
peço.
Tenho, contudo, a suspeita de que esta memória é diferente daquela com que
nasci e durante tantos anos me serviu. Não digo que me negue serviço ou se
tenha tornado lenta, mas como que se lhe acrescentou uma dimensão crítica que
antes não possuía.
Assim, quando por vezes, saudosista, quero relembrar uma data, uma conversa, é
como se no íntimo uma voz se interpusesse, perguntando com rispidez que
necessidade tenho desssas informações. Se me tornei incapaz de separar o trigo
do joio, o importante do banal. Se para mim, em vez de uma função, o recordar
passou a ser um jogo, um entretém.