Já passaram os rissóis de camarão, a
alheira, a chouriça grelhada, a salada de polvo, a canja de galinha.
O vinho, um tinto caseiro com seis anos de adega, excede de longe o que dele se
esperava. Com os filetes de pescada chega a notícia da morte súbita de uma
prima idosa que vivia em França. Entremeando uma ou outra recordação, e
comentários apropriadas à má nova, atacamos a vitela assada no forno.
A senhora da casa exagerou nas sobremesas: ele há pudim, sonhos, arroz doce,
rabanadas (feitas especialmente para o conviva que gosta muito delas), salada
de frutas, leite creme, pastéis de nata… Vem um Porto, fabricado numa quinta da
Vilariça em 1995. Grande vinho.
E de novo se recorda a falecida, mas agora quase com ligeireza. Bebe-se mais um
cálice. Fala-se da morte em geral e comenta-se que, tirando um, os sete
restantes somos todos prováveis candidatos para, a breve prazo, fazermos a
última viagem.
A propósito de mortes, o mais idoso dos presentes, noventa e cinco anos daqui a
semanas, recorda umas quadras. Discute-se se serão do Aleixo. O mais novo quer
saber quem é o Aleixo. Ninguém lhe responde.
O geronte anfitrião declama sentado:
Desde que o mundo é mundo,
Muita gente tem morrido.
Nem na Terra fazem falta,
Nem o Céu se tem enchido.
Ó Morte! Ó terrível Morte!
Eu de ti tenho mil queixas!
Quem deves levar, não levas.
Quem deves deixar, não deixas!