Desde há uns tempos anda a rapaziada aos gritos a
manifestar contras as variadas misérias presentes, passadas e futuras, o
racismo, a escravatura, a discriminação, o clima, o aquecimento global, a
violência doméstica, a sujidade dos oceanos, o desgaste do planeta, e sabe Deus
quantas mais que escapam ao meu cansaço, aborrecimento e distraída atenção,
porque se dá o caso que me interessam pouco ou nada, pelo simples motivo que já
vi tantas vezes o filme que se me tornam cansativos os berros e os slogans, os
punhos erguidos, as exigências bacocas, o pichar das estátuas, as pilhagens.
O que me tem chamado a atenção é o facto de, como as
idas à praia, estas “festividades” se
realizarem agora aos sábados e domingos. As do “Paris 68” duravam dia e noite a
semana inteira, era sabido que havia papás que depois do jantar ordenavam ao
chofer que levasse os meninos a tomar parte na revolta e os ajudassem a arrancar
as pedras da calçada. Esses tomaram-lhe o gosto, aprenderam aí como se chega ao poleiro onde desde
esse tempo estão confortavelmente sentados.
Estes de agora, que só se sentem revoltosos à noite ou
no fim-de-semana, desapontam-me pelo condicionamento do seu entusiasmo, e ainda
porque aguçam em mim a curiosidade de saber como se comportam durante os dias
úteis da semana na escola e durante o trabalho. Esperava que no dia-a-dia não
parassem com as exigências e o berreiro, mas pelos jeitos ainda têm de aprender
que uma revolução com horário está destinada a falhar.