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O sinal de que se queria que o padre benzesse a
casa - crentes ou ateus quase todos o
queriam - era espalhar defronte da porta da rua um braçado de verdura e flores.
Mas a espera era longa. Passava a manhã e às vezes a tarde ia já a mais de meio
quando por fim o “compasso” nos chegava à porta.
Ficávamos em pé na sala, junto da mesa onde
estavam prontos os cálices, os doces, as oferendas de comestíveis que a igreja
distribuiria depois pelos pobres e o envelope com o folar.
O padre chegava à frente, seguido do sacristão e
do mordomo com a caldeirinha da água benta. Como a sala era acanhada, dos
outros só cabiam dois ou três e o resto esperava fora. O padre dizia “Aleluia!
Aleluia!”, nós ajoelhávamos, e pegando no hissope ele aspergia-nos a todos.
O sacristão chegava-nos o crucifixo a beijar,
depois de cada beijo limpava-o com uma toalha, e o padre murmurava a
desejar-nos uma Páscoa feliz. Depois, enquanto um mordomo recolhia
discretamente o folar e outro as oferendas, meu pai enchia cálices de vinho
fino para todos e debicávamos os doces.
Por
sermos uma família pequena a benção e o convívio duravam apenas uns minutos, e
recordo que isso me acabrunhava, porque tudo parecia ter mudado desde a morte
da avó Maria, de quem, estranhamente, eu sentia cada vez mais a falta. Creio
que foi também por essa altura que melancolicamente comecei a dar-me conta de que já tinha um passado."
................ in Ernestina