A farmácia e o restaurante são dos raros estabelecimentos em que quem lá entra vai decidido a comprar. Aqui nada se vende e o visitante pode ter entrado por simples curiosidade, mas já agora não se despeça antes de ler. E ao findar pare um instante, deixe correr o pensamento.
A noite passada o acaso levou-me a reler umas páginas de Naples '44 de Norman Lewis (1908-2003), prolífico escritor de livros de viagens, que ao findar a Segunda Guerra Mundial era oficial do exército britânico que ocupava Nápoles.
O livro impressiona pelo testemunho do que é capaz a natureza humana em situações de desespero, mas aqui apenas interessa a passagem em que Lattarullo, um velho advogado napolitano, se oferece como informante:
"Era ele um dos cerca quatro mil advogados que há em Nápoles, dos quais noventa porcento nunca exerceram a profissão e, na maioria, vivem em extrema pobreza. Calcula-se que haja na cidade um número igual de médicos em idênticas circunstâncias; estes famintos académicos são o produto acabado da firme determinação da pequena burguesia napolitana em ter um rebento com um inútil diploma universitário. Os pais não hesitam em passar fome para que o filho alcance o direito de ser respeitosamente tratado por dottore".