A meio dos trinta, com bastante de seu para deixar a Arquitectura, que começava a enfastiá-lo, vai em dois anos que o Jean-Pierre – a mãe é parisiense – comprou numa aldeia dos longes nortenhos uma casa arruinada, mas com um enorme terreno, e a rara vantagem duma nascente de água, que mesmo no pino do Verão mantém o caudal.
Compôs o que havia a compor, aprendeu os costumes, frequentava ambos os cafés, a todos mostrava boa cara. Compreenderam os vizinhos que tivesse murado o terreno, evitando assim aborrecimentos com os pastores que, “distraídos”, só davam conta da invasão quando as cabras já tinham enchido a barriga no plantio.
Para ele o prejuízo era pouco ou nenhum, ao abuso fechava os olhos, mas num lugarejo contam regras que o citadino ignora, e qualquer prova de fraqueza é pecado capital. Assim se viu Jean-Pierre uma tarde à conversa no café, não se dando conta de que a cavaqueira era de facto mau prenúncio, os bons modos uma cortina de fumo.
Tinha toda a razão em murar o terreno para se defender das cabras, mas deixavam eles de poder tirar água da nascente, pura e bem melhor do que a da Câmara, que cheirava a químicos.
Sorriram, ele sorriu, ia pensar o que se poderia fazer, mas ao último aperto de mão já tinha esquecido a promessa.
Lembraram-lha eles com o pneu furado. Depois o tempo foi passando e nada acontecia, convenceu-se que de facto tinha sido acaso, tanto mais que nem nos modos ou nos sorrisos notava diferença.
A morte do Alsácia vieram anunciar-lha, devia ser sido por comer algum bocado de carne com veneno dos ratos. O golpe de misericórdia deram-lho os da fonte. Sem rodeios. Nunca por ali se via uma mulher a visitá-lo, só homens, e ninguém tinha com isso, claro, mas não se gostava.
Já lá não mora, e aprendeu que ao contrário da cidade numa aldeia não há segredos, só interesses.