Desde que a relação findou, dois anos, quase três, nunca mais se falaram. De longe a longe ela envia-lhe um mail, "penso muito em nós", raramente variando a frase, um tom de grito em surdina, apelo à recordação.
Nunca reage, uma única vez quase cedeu à vontade de lhe lembrar o aniversário de uma noite de paixão, mas conteve-se, cerrando os dentes, mentindo a si próprio com um "o que lá vai, lá vai", consciente do perigo que corre quando enfrenta a quimera da sua felicidade.
Mulher, filhos, família, obrigações, rituais, tudo se lhe assemelha vazio, desbotado, impossível de comparar à verdade do que sentiu e partilhou, do que teve e perdeu.
Dispensa a fantasia para imaginar a vida que o espera: olha em volta, chora sem lágrimas e, como ela, também grita em surdina.