segunda-feira, julho 8

Bilhetes (47)


Falar de certas passagens da vida pode satisfazer a curiosidade alheia, mas verdadeiro proveito só tem o de dar algum alívio.
Calhou-me o bizarro destino de depois de quarenta anos a ser lido e estimado em terra estranha, a pátria descobriu em simultâneo a minha prosa e a minha existência, durante uma curta década não me faltaram agrados, cumprimentos, homenagens, atenções, e até prémios recebi.
Calhou-me também ser apaparicado, que muito boa gente se desse ao trabalho de me procurar e jurar simpatia, amizade, admiração, embora eu, por não pertencer à tribo, ignorar os rituais e ter ganho outros hábitos na estranja, caísse no engodo, tomando por moeda de lei o que era pechisbeque.
Essa armadilha em que me deixei cair foi de  pouca dura, quando o descobri comecei a manter distância entre mim e os bajuladores, separando o trigo do joio, dando a conhecer as minhas opiniões sobre a política e a sociedade, assustando a boa gente ao tornar público as razões por que na Holanda tinha votado num partido da Direita, cuspindo-me alguns por me ter “vendido” ao “abjecto” Correio da Manhã.
Por essas razões e mais algumas deu-se o bom povo conta que não sou nem virei a ser aquela figura de escritor e pessoa pública que faz jeito ter como íntimo, à maneira de troféu de caça. Como deixaram de me procurar e não me verão em feiras, festejos, conferência ou congressos, nem têm de mim provas de amizade ou intimidade que possam badalar, estamos todos em santa paz: eles no seu  mundo, eu neste meu canto, onde me procura quem quer.
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PS. Se o Manuel Jorge Marmelo passar por aqui agradeço que me contacte.