Deve ser coisa que tenho de nascença, certo é que logo de criança me apercebi da qualidade de me tornar invisível. Não era e não é pela escassa estatura, deve ser algo que, em certos momentos, me faz desaparecer aos olhos dos outros.
Por vezes, num jantar ou convívio em que estou há horas, há sempre alguém que de repente me encara espantado, como se me julgasse defunto, esperasse longe, me visse cair do céu, ou ser tirado de um daqueles armários que os prestidigitadores usam nos circos, e donde fazem aparecer e desaparecer tigres, bandos de pombas, mulheres nuas soprando labaredas ou serradas ao meio.
Deve haver outros que conhecem essa situação e, como eu, se maravilham com a indiferença do semelhante naquelas ocasiões em que dele se espera o que se chama as boas maneiras.
Assim, para tratar assunto de mútuo interesse, me encontrava eu, dias atrás, no gabinete de uma Power Woman. A meio da conversa teve ela de atender uma chamada, retirei-me discretamente para o fundo da sala. Devia ser assunto de peso, porque quando olhei o relógio já passara um quarto de hora, mais um quando desligou.
E então aconteceu: tinha-me tornado invisível, surgia ali por mágica, a madame não gritou quando me viu aproximar, mas quase.
O que aqui vem ao caso não é a distracção sincera ou fingida das pessoas, mas a indiferença que mostram pelo semelhante e nem sempre conseguem esconder.