A peste, o medo, os mortos, os que se vão matar hoje, os que esperam por amanhãs que não vão chegar, os que dizem que ainda aguentam e sabem que já estão para lá do desespero. Os que se fecham em casa à espera de um fim que vai tardar, porque ninguém virá acudir-lhes nem livrá-los do sofrimento, nasceram com a má estrela da sua doença não valer as letras gordas das capas ou dos noticiários, nem a piedade das figuras que tão bem sabem falar da solidariedade que sentem e dos grandes esforços que fazem.
Num tempo assim e com gente desta não há razão para ter esperança ou sonhar com amanhãs que não vão chegar. Estamos na fase do será o que Deus quiser, e talvez Ele na sua imensa bondade decida apiedar-se e nos livre a todos deste sofrimento. Não, não desejo a morte de ninguém, nem sequer a dos robertos que fingem governar, mas uma espécie de carraspana mundial e, a cair de bêbados e rebeldes, in vino veritas, saiamos à rua a gritar a verdade do que pensamos, chamando os bois pelos nomes e pedindo contas. Não, não sou pela violência, mas há horas em que tenho esperança na força do ridículo. E se não desejo que morram, daria muito para viver o momento em que o ridículo os matará, os políticos, os comentadores, os cientistas de meia tigela, os pavões inchados de sabedoria que nos vêm dizer que o remédio é calar e aguentar, eles nos dirão em que dia teremos licença de sair à rua.