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Há quem viva uma, duas, meia dúzia, ele assusta-se quando se dá fé de que perdeu a conta às vidas que já viveu, incapaz de destrinçar as que foram a sério, reais, vividas, daquelas a que a si próprio assistiu, como o actor que se entranha a representar e, terminado o espectáculo, continua a ressentir as emoções do papel.
Nesse excesso de
vivências reside parte da dificuldade que tem no trato com o semelhante, pois
raro encontra nele a sintonia que facilita o entendimento, e na troca de
palavras tem por vezes a impressão de que se apoia cada um no seu próprio
dicionário, resultando a conversa, não numa de surdos, mas num intermezzo longe
de ser cómico.
Felizmente não lhe
vem daí melancolia ou decepção, nem sequer solitude, apenas algum pasmo de que
assim seja, e que o muito que lhe foi dado viver só o não ostraciza porque,
para o geral, a vida conta menos que o papel que nela se representa.