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Andei muito, sempre apressado, ciente de que, mesmo correndo, a sociedade me deixaria para trás. E assim é. Das maneiras à mecânica, dos biplanos aos milagres da Medicina, das conversas de café às amizades do Facebook, foi incrível a reviravolta, devem ser muitos os que, como eu, ressentem uma desagradável sensação de desnorte.
Sou de uma das gerações criadas na bela ilusão do ideal
solidário, de amanhãs tão soalheiros que, tribal ou mundial, nenhuma guerra teria
horror bastante para ensombrá-los.
Inesperadamente, as sombras criadas pelas hecatombes depressa
esqueceram, e embora nos amanhãs de muitos o sol nem sempre brilhe, para quase
todos são mais frequentes as abertas.
Mas porque assim tinha que ser, ou Deus assim mandou,
foi-se-nos o ideal solidário e deixámos que viesse ao de cima o conforto da
indiferença, trocámos o desagrado do dia-a-dia pelos arcos-íris da realidade
virtual.
Desse modo pôde dias atrás acontecer que, num eléctrico
de Amsterdam, o destravado que puxou duma
pistola tivesse de desatar aos gritos, porque os passageiros, entretidos
todos eles com os seus smartphones,
não se davam conta do assalto.
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