Há infernos. Entre as quatro paredes há
infernos insuspeitos, com ódios, invejas, fúrias que queimam fundo e mais
lentamente que as labaredas de Belzebu. Infernos de fogo lento, diário, com
pausas inesperadas entre o martírio, não para que se sinta alívio, mas para que
na carne e na alma se renove a dor.
É família grande, creio que nove ou dez.
Vêm daqueles ramos fracos da burguesia que, duas ou três gerações, conseguem
manter uma aparência de prosperidade. A estes tramou-os a revolução e a inocência
do ideal. Foram crentes fanáticos, de uma fé sem medida, a de que o sol iria brilhar para todos, mas para eles com
o calor especial reservado aos eleitos. Esperaram. Não se deram conta das
nuvens, nem da competência e ganância da alcateia, quando a crueza da realidade os sacudiu já não
havia bons bocados, só ossos. Desses conseguiram esmolar um dos mais pequenos,
insuficiente para os nove ou dez que nada mais têm que rilhar.
Entre
as quatro paredes vivem no inferno. Quando saem delas esforçam-se por manter a
compostura, mas dá pena aquele teatro. Nos ademanes, na fala, no vestuário, nos
tiques, tudo denuncia a derrota, tudo aponta para um desenlace que, tirando-os
do inferno das aparências, os lançará no
da pobreza envergonhada.