Digo-me que é do calor, mas não é. Nem da preguiça, nem do ladrar dos cães do vizinho, nem do melro que me acorda às quatro e meia da manhã, pontual como se tivesse relógio. Tão pouco é do romance que ando a ler, obra de um sueco de fama, história mal escrita e mal traduzida. O almoço foi bom, soube-me bem, dormi uma regalada sesta, por isso não é daí que vem o mal. Arrelias de momento não tenho, e as passadas há muito as esqueci. Tragédias que me toquem de perto, não vejo nenhuma. Que o tonto desenterre Simón José Antonio de la Santísima Trinidad Bolívar Palacios y Blanco não me aquenta nem arrefenta...
Donde virá, então, este extraordinário vazio da cabeça, estranho e invulgar como uma experiência extracorpórea, eu a olhar assustado para o espectro que se senta diante do computador e se dá uma ilusão de existência alinhavando dúzia e meia de palavras? Donde virá?