Ambos na varanda, à sombra do toldo. Ambos com o jornal, No domingo festejaram vinte e cinco anos de casados. Festejaram é modo de dizer, porque parentes chegados não têm e o filho está na Suíça. Foram ao "Rei do Pito"comer um frango no churrasco e depois, como quase todos os dias quando o tempo ajuda, sentaram-se na varanda a ler o jornal.
Ergue os olhos com a impressão de que o ouviu dizer qualquer coisa, vê-o levantar-se e ficar um instante indeciso, apoiado no rebordo.
- Sentes-te mal?
Ele abana a cabeça, vai para a sala. Mudou muito desde que lhe deu o ataque, tem dias que não se lhe ouve uma palavra. Bom homem. Trabalhador. Nunca lhe tocou, nem com a ponta de um dedo. Hesita um momento se irá ver, mas aquieta-se ao ouvi-lo tossir. Pousa o jornal no regaço, perdida em recordações. Vinte e cinco anos é muito tempo. Calhou este, podia ter sido outro, que namorados não lhe faltavam, mas foi esperando, esperando, e com os anos... Pensava assim, pensava assado, um era mais bonito, outro estava bem na vida, o Samuel tinha dois táxis. Para dizer a verdade ele não foi escolha, às tantas foi o que se arranjou. Mas não se arrepende.