Aquilo da Sara no karaté
“Sara Sampaio mostra tudo no
karaté. Modelo portuguesa protagoniza vídeo ousado e mostra demais.”
Tenho ideia de que bastou o título no jornal para que
as hormonas da rapaziada adolescente se pusessem a ferver. Da rapaziada
adolescente e não só, mas de todo o macho heterossexual, mesmo aqueles em quem,
pela idade, doença, ou avarias do género, o cio é uma nostálgica recordação.
Apressaram-se eles a ir ver, acompanhados pelo bando de gulosos voyeurs,
correram lá rapariguinhas e mulheres, secretamente invejosas da beleza alheia
ou odiando a concorrência.
Fui eu também, e se tivesse de me justificar, ou a um
abespinhado ocorresse pedir contas do meu interesse e curiosidade, esperando a
má desculpa do ancião lúbrico apanhado em flagrante, bem teria de o desapontar.
É que nem sequer lá fui por interesse profissional, farejando ali, quem sabe,
inspiração para uma novela erótica, antes levado pelo desconsolo que me causa a
triste sociedade para que vamos escorregando, cada vez mais artificial, mais
fabricada, tão infantil que do Betinho ao Papa todo o gato-sapato imagina a
humanidade interessada nos seus twitters.
Fui, pois, ver o vídeo da Sara. Embora seja nulo o meu
interesse pela existência da menina, a sua beleza, a generosidade das formas
com que Deus a dotou, o êxito que tem no
ramo em que trabalha, confesso que me diverti. Não tanto com os seus saltos e
caretas, a violência a fingir, aquela da “mão de ferro” a quebrar o barrote,
mas pelo gosto que me deu fantasiar o ambiente em que as cenas foram filmadas e
o género de diálogos entre os participantes.
Que foi coisa profissional não há dúvida, pois entre
músicos, manicuras, visagistas, directores artísticos, operadores de câmara e
outros, contei trinta e seis pessoas.
- Ó Sara, tens de repetir! É que não se vê!
Sara faz outra reviravolta, exagera a careta, arregala
os olhos, arreganha os dentes, finge de mauzona, atira a perna para o alto, e a
bufar de cansada pergunta se saiu bem.
- Saiu mal, querida! Não chega. É preciso que levantes
mais, e tem de ser na lateral, no instante em que giras para a direita e
estendes o braço num movimento enérgico. Experimenta agora com a outra perna e
curva-te mais um bocadinho. Para dar certo tem de parecer que foi acaso, que
foi mesmo sem querer.
Cansada, a resfolegar, mas submissa ao que dela
esperam, ciente também que a fama e o bom dinheiro exigem sangue, suor e as
lágrimas que ninguém vê, Sara Sampaio recomeça pela enésima vez os saltos da
sua falsa ousadia.