quarta-feira, agosto 31

Ar, vento e dinheiro

 

A política é a arte de em vários planos alcançar poder e proveito, nela se movendo uma infinidade de personagens. Poderão os ditadores estar no topo, mas abaixo deles é longa a lista dos que, espertamente cautelosos, sabem alcançar poder e proveito, evitando o destino de um Saddam Hussein. Se por acaso lhes vemos o rosto, raro nos damos conta da influência que exercem sobre as nossas vidas, ou de como decretam até que ponto apertar o nó, de maneira a que continuemos a respirar, mas receando que de um instante para o outro nos falte o ar.

Poderá um ou outro ser apanhado com a boca na botija, mas esses só são interessantes como notícia e logo esquecidos, caso haja inundações ou um avião caia ao mar. Os que devemos temer e jamais veremos atrás de grades, são os artistas de topo na prestidigitação, que roubam dando ideia de nos favorecer. Num tempo mais sereno o lucro das companhias de electricidade revertia para o Estado, mas hoje a maioria é privada e tem por alvo o máximo benefício dos accionistas.

Como esse interesse particular se dá bem com o medo que causa o suposto aquecimento do planeta, promova-se então a energia eólica, que oferece o duplo benefício de, além de “verde”, ser  fonte de colossais subsídios que vão parar às mãos daqueles que, por serem ricos, dispõem dos instrumentos que lhes permitem encaixá-los. Na Holanda, onde vivo, os lavradores recebem 30.000 euros líquidos por cada eólica que instalam nos seus campos, subindo a milhares de milhões a importância necessária para subsidiar as energias “verdes e limpas”. 

Ora como o dinheiro não é de geração espontânea, há que ir buscá-lo aonde se encontra como que à mão de semear, simplesmente aumentando o preço e os impostos sobre a maléfica energia “suja”. 

Curiosamente, todos os partidos, ferrenhos que são na defesa do meio ambiente, escamoteiam  a realidade de que na Holanda, nos últimos dez anos, e mau grado os desproporcionados subsídios às empresas geradoras de energia “limpa”, as emissões de CO2 aumentaram 2%, enquanto na Europa diminuíram 25%. Também  dá que pensar o facto das confederações patronais apoiarem a entrada no futuro governo do partido “Groen Links” (bizarra coligação  da extrema esquerda, dos “verdes” e dos comunistas).

E é de facto como está no artigo donde tirei alguns dados: “Os fornecedores de energia “limpa” não cumprem, mas encaixam, e por recompensa receberão mais subsídios, para mais moinhos, sendo a conta apresentada às classes baixa e média. Alucinante.”   

Estava isto alinhavado, vem um abaixo-assinado de nada menos que noventa catedráticos, a aconselhar que para lá das verbas já calculadas, se reservem ainda  duzentos mil milhões de euros para mais moinhos. É alucinante é, mas há tanto e tão bom dinheiro a ganhar com o vento.

 

segunda-feira, agosto 29

Repetindo

 

Vivi alguns anos no ideal romântico de ser a universidade aquela instituição que nas ideias, nas ciências e nas técnicas, tem por finalidade e dever transmitir o conhecimento e estimular o progresso.

Se bem que três décadas de docência não tenham abalado de todo essa minha utopia do instituto universitário, e mantenha alguma esperança, verdade é que do confronto com a realidade poucas ilusões me restam.

Mais do que a subserviência de boa parte dos colegas para com tudo que fosse poder ou superior hierárquico, desiludiu-me sobretudo o inesperado, e para a minha inocência improvável, maniqueísmo dos estudantes, tão prontos a negar evidências, como em insistir serem senhores e donos de soluções para o caos do mundo, bastando dar-lhes o braço e seguir com eles o bom caminho.

São os descendentes desses maoístas e terceiro-mundistas que hoje enchem a boca com os perigos do aquecimento global, a urgência de energias limpas, os malefícios do  CO2 e umas quantas novidades mais. Não aceitam que os contradigam, demonstrando um conformismo que é a negação do espírito universitário em que se educaram, do qual não se espera  obediência, mas que seja livre no ajuizar e na investigação.

Semelhante mentalidade contribui para tornar impossível o diálogo, pois os membros dessas “elites”, quase diria seitas, tendem para a histeria política, mostrando-se mais inclinados a seguir o que é moda e os ditames do grupo a que pertencem, do que os do próprio raciocínio, ou as razões alheias, o que os predispõe para uma mentalidade de carneirada.

Possuem também um inerente anseio em se manterem do lado “bom”, de sem espírito crítico ou discussão aceitarem as “boas” instituições; de verem o aspecto  “positivo” da avalanche de refugiados; de imporem os “bons” hábitos alimentares, etc.

No que respeita a energia só conhecem uma solução aceitável, a sua, em que ela é “limpa”, embora cuidem que perto donde vivem não se instalem moinhos de vento. São infalivelmente bondosos e compreensivos para com os refugiados, correm pressurosos a salvá-los das águas do Mediterrâneo, mas não os querem no seu bairro, antes se esmeram para que os acomodem longe.

Entristece constatar que, a respeito da política, das questões sociais e das tragédias dos nossos dias, muitos dos que gozaram um ensino superior se distingam por um comportamento de rebanho. E que quando, por acaso, pensam duas vezes antes de agir, não o façam para defender uma opinião pessoal, mas para evitar que os julguem dissidentes.

 

domingo, agosto 28

Corona e contratempos

Malgrado a irregularidade da publicação são ainda muitos os que aqui continuam a vir. Muitos  mais do que esperava quando em Janeiro de 2007 comecei. Grato a todos.


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A galinha pedrês


Muitas vezes é pena perdida querer descobrir a origem de uma alcunha, sobretudo das que são dadas por malícia ou razões que têm a ver com manias ou maneirismos. O caso da Belarmina foge a essa regra, porque passou a ser a “Galinha pedrês” quando, quase do dia para a noite, se tornou grisalha, fenómeno tanto mais estranho por ter sido o seu cabelo dum preto retinto.

Perguntar-lho de caras ninguém se atreve, porque além de pouco dada a intimidades, sabe-se dela que não tem a vida fácil, tanto pela má sina do casamento com o Adriano, um trombudo cheio de si próprio, como pelos rebentos que daí nasceram: o Dino, que logo na primária deu mostras de que era de boa cepa e aos dezoito tinha cadastro, mas e sobretudo a Manuela, exemplar acabado dos extremos a que pode chegar quem, junto a fraca cabeça, toma por garantido e à letra que a liberdade é mesmo isso: não reconhecer obstáculos ou limites.

Todavia, depois de se ter dado a umas quantas experiências, e sofrido os desagradáveis resultados das mesmas, Nelinha decidiu que a liberdade à portuguesa não prestava, e em busca doutros ares nem dos pais se despediu, simplesmente desapareceu.

Aguardaram eles esperançados que nada de mau acontecesse, mas não lhes perguntem agora o que pensam, pois com tão grande abalo nem eles próprios o sabem, e não irão recuperar tão cedo.

Num inesperado aparato de câmaras e luzes apareceu-lhes a TV à porta, se eram eles os pais do Karl, famoso em Berlim. Desconheciam, tinha de ser engano, o Danilo estava a chegar e a Manuela... Mostraram-lhes então uma imagem do dito Karl, a Manuela chapada, cabelo à escovinha e uniforme de paraquedista, famosa por em Berlim ter sido uma das primeiras dez pessoas a valer-se do direito de ir ao Registo Civil e declarar a que sexo (género) desejava  pertencer e que nome queria usar.