terça-feira, fevereiro 12

Esperanças e enganos


ESPERANÇAS E ENGANOS

A Madalena e o Ricardo. Ela, minha afilhada, e desde que nasceu menina dos meus olhos; ele neto de um velho camarada dos tempos da Guiné. Andam ambos a enganar-se, e pode ser que esteja errado ou os anos me perturbem o entendimento, a minha ideia é de que seja qual for o fim ambos vão perder. Perderei eu também, porque às escondidas um do outro me tomaram por confidente, mas da maneira como as coisas estão, só atraiçoando um deles poderei evitar um mau desenlace. Deixar correr não é boa opção, além de que me desagrada ver a afilhada com um namorado que não me parece forma para o seu pé.
É namoro à moderna: agitado, um não acabar de Facebook e Twitter, Instagram, com tanto burburinho que se conhecem mal e quase que só se encontram na companhia doutros. Isso, porém, como que lhes aumenta a febre, e é um não acabar de declarações, confissões, projectos do que vai ser e como terá de ser.
Ele quis-me mostrar uns mails em que ela lhe escreve coisas apaixonadas e as respostas que lhe deu. Quase cedi à curiosidade, mas por prudência recusei. Isso porque dias antes me tinha ela contado que às vezes este namoro lhe parece  brincadeira, um passatempo. Acha o rapaz engraçado, atencioso, romântico à moda antiga, mas humor não conhece, diz a sério que o que chamam cultura está tudo no Google.
Conta-me a afilhada que de vez em quando tem de lhe explicar o evidente, e isso mata o entusiasmo. Ambição não possui, nem sabe o que seja, e quase nos  trinta continua a viver com os pais. Também lhe confessou que só tinha tido uma namorada e a ligação acabara mal, estava convencido que nunca conseguiria. Mas agora!...
- É um querido, não achas? E gosta tanto da mãe!
O sorriso com que Madalena diz aquilo é de mau agouro, mas o pobre, apaixonado como anda, mesmo que estivesse presente não iria desconfiar. Conta-me ele os sonhos, os planos que faz. A casa vai ser construída perto da dos pais, quanto mais não fosse porque lhes deve tudo. E anda a informar-se  sobre qual será o melhor destino para o mês inteiro da lua de mel. Que penso eu de um cruzeiro às Caraíbas? Ou Roma? Paris? Se bem que Paris... Nenhum deles fala francês e ouviu dizer que os parisienses são embirrentos. Se ficarem pela Europa irão de carro. Quer um novo e já perguntou à Madalena de que marca gosta mais, mas ela não respondeu.
Será que andam ambos a enganar-se? O futuro o dirá. Também pode ser que seja eu a sofrer de pessimismo, mas são tantos os que começam assim, e quando acordam estão no altar.