sexta-feira, junho 26

Estupor de mundo


Estivesse eu na idade de ceder a impulsos, provavelmente ia asnear e correr perigo, não só porque me é cortada a liberdade, como me tira o fôlego o sentimento de viver numa sociedade policial de esbirros e bufos, com gente a olhar e lado os que vão sem máscara, os que espirram e tossem, os que se aproximam dando-te a impressão de que és leproso. Sociedade que nunca imaginei possível: cobarde, domada, agachada, denunciante, à espera da Inquisição, e que não demore a fogueira para os que não entram no cortejo nem veneram os manipansos da política, os que se passeiam em cuecas e não recuam na baixeza, porque vale isso e mais, vale tudo para ter o chicote na mão e o poderio de mandar que o rebanho se agache.
Estupor de sociedade, estupor de mundo, aos meus e aos que quero bem não posso repetir com verdade o que tantas vezes me disseram e foi a minha fé: que viria um mundo de justiça, harmonia e prosperidade. Mas o que veio foi este: injusto, mais desigual que nunca, um mundo de medo, desespero e sombrios amanhãs.