No dia 13 almocei com os padres. Fátima e o Papa despachámo-los em curtas frases de circunstância, apreciou-se o cozido e falou-se de carros. Melhor dizendo: falaram eles, perplexos com a minha ignorância, descrentes de que não soubesse que cilindrada e quantos cavalos tem o que há anos me traz e leva.
O padre Abel, grande postura, bom garfo, jovial no modo, entrou a explicar as excelências do seu Mercedes. Dos seis cilindros do motor ao macio do cabedal dos assentos; do conforto dos amortecedores à maravilha do GPS; do arranque – "Em 6 segundos chega aos 100! " – ao brilho da pintura, tudo no seu Mercedes lhe é motivo de apreço.
- E então os travões? Na garagem já me perguntaram se não travava! Porque aquilo não se desgasta! Garantia? Até aos seis-cen-tos-mil-quiló-metros! Nenhuma marca faz isso!
O outro, o padre Sampaio, miudinho, estrábico, interrompia de vez em quando, repetindo que de facto carro nenhum chegava aos calcanhares do Mercedes. De súbito, porém, como se o seu cérebro se tivesse desarranjado, pareceu esquecer os automóveis e, às gargalhadas, o dedo a apontar, atirou ao colega:
- És muito político! Vais com eles de braço dado, prometes tudo, e quando julgam que sim, que a coisa está arranjada, zás! passas-lhes uma rasteira. Olha que és muito político!
Não sei do que se tratava, mas como eles riam, ri também. Depois houve um momento de silêncio e pedimos a sobremesa.