sexta-feira, maio 7

Os lindos braços da Júlia da farmácia


Os braços da Júlia da farmácia ainda um dia o deitam a perder. No emprego usa a bata branca do regulamento, mas na rua, mal o tempo aquece, passeia-os em todo o esplendor da nudez, e a impressão que tem é que ela faz aquilo de propósito, com a única intenção de lhe acender calores que julgava extintos.

Como se conhecem, encontram-se às vezes no café, e é um tormento. Pele com maciezas de seda, a penugem dourada , a delicadeza dos pulsos, o suave redondo dos ombros! Esforça-se por mostrar que a ouve atento, mas naquele sonho de que delícia seria tocar-lhe, mesmo de leve ou a fingir acaso, antes de dar conta já os olhos resvalam para os dedos, acariciam a perfeição das unhas, sobem pelo antebraço, param nos ombros.

- Estava eu a dizer...

Faz o trejeito involuntário de criança apanhada em flagrante, e ela continua, finge não reparar. Para ambos é um jogo, mas só o de Júlia é inocente. Sente os tremores, adivinha-lhe a excitação, por vezes a segredar qualquer coisa quase lhe toca e não lhe escapa o fremir das narinas. Mas depois diz-se que se engana.

- Está a ver? Não sei porque estou a falar disto. Então um senhor que conheço desde pequena, colega do meu pai, que até já tem netos... E tão carinhoso. É tolice minha, não é?

Aceno que sim, que de facto é tolice. Surpreendi-a ao dizer-lhe que tinha uns braços muito bonitos e ela contou-me o caso.