Excerpto da análise de Rui Ramos no Observador de hoje: A “luta de classes” voltou
à Europa? /premium
“Houve a fuga para a frente dos anos 90, quando o medo da
Alemanha unificada precipitou uma unificação a mata cavalos. Mas houve também,
nas últimas décadas, o que Michael Lynd, em The
New Class War: Saving Democracy from the Metropolitan Elite
(Atlantic Books, 2020), e Jérôme Sainte-Marie, em Bloc contre Bloc: La Dynamique du Macronisme
(Les Éditions du Cerf, 2019), descrevem como a emergência, nos meandros da
globalização, de elites internacionalizadas, dispostas a tratar as antigas
nações como coisas obsoletas. Os seus valores são os dos actores
“progressistas” de Hollywood. Apreciam os imigrantes, que trabalham
obedientemente nas suas cozinhas, mas abominam as plebes mais antigas do
Ocidente, a que atribuem toda a espécie de preconceitos, a começar pela afeição
nacional.
Jêrôme Sainte-Marie resume
pitorescamente a sua análise recorrendo a Karl Marx: a “luta de classes”
consistiria hoje no confronto entre elites cosmopolitas de “quadros” com
grandes rendimentos, tentando agregar a si as “minorias”, e, do outro lado, os
operários, o mundo rural, e as classes médias mais tradicionalistas. As elites
acusam os seus críticos de constituírem uma ameaça à democracia, enquanto
“populistas”; mas são as próprias elites que parecem cada vez mais impacientes
com um sistema que nem sempre conseguem controlar. Daí, na Europa, a tentação
de usarem a UE como um meio de diluir as comunidades nacionais numa estrutura
burocrática de tipo imperial, ao abrigo de surpresas eleitorais.”