"O Bártolo tinha dito que as vira descer a
ladeira, as mesmas do ano passado e mais duas que não conhecia, novas, com
roupas de cidade, todas pintadas! 
– Estão além do palheiro. 
Encolheu os ombros porque ainda não se atrevia e afinal também era cedo, os
músicos nem sequer estavam no coreto. 
– A mim é que elas não apanham – disse o cabo de ordens. 
– Com a escarmenta do ano passado... 
– O Zé já lá está metido! 
Falavam por falar, à espera da noite, precipitando-se logo quando o Marques
abriu as portas e os deixou entrar, carrancudo, nem que lhes fizesse favor,
medindo os copos em silêncio.
O Grande, sentado no chão, tonto porque não parara de beber desde manhã,
encostara-se à mulher e ressonava. 
– Já cá venho há três anos a fio, mas é terra pobre. Vinte mil réis, trinta...
Este deu-me duas notas o ano passado, mas também... Cruzes! Ainda bem que está
com o vinho! – A rapariga acendeu o cigarro com cautela por causa da palha, depois
cuspiu no fósforo. 
– Se é assim! 
– Há os outros. 
– Onde é que se dorme? 
– Aqui. O que é que tu querias? 
A porta chiou e o vulto recortou-se um instante, passou para dentro. 
– Quantas somos? – perguntou ainda a rapariga. 
– Cinco. Se a Micas vier. 
O homem sentou-se junto delas, sem uma palavra, o luar que entrava pelas
frinchas mal dava para ver. 
– Quem começa? 
– Eu, então. – E dirigindo-se a ele: – São cinquenta. 
Estendeu a mão e riscou um lume para examinar a nota. 
– Vamos lá. 
O Manuel levantou-se, agoniado porque lhe vira a face, a querer recusar-se: 
– Eu fui com vossemecê o ano passado. Mais quero a rapariga. 
Ela continuou a caminhar por entre as faixas, não dando importância, sem se
voltar. 
– Vem, se queres. 
E ele foi, dócil, ajudando-a a estender a palha no chão. 
Dinheiro perdido. Quando se pôs em pé quase tropeçou no que esperava, outros
atrás, o palheiro cheio, reconhecendo--se, mas sem uma fala, as mulheres
ocupadas, ofegantes os que
se apressavam, os rapazotes num canto, medrosos ou paralisados, alguns deixavam
passar a vez e saíam, davam uma volta, entravam de novo, até que os camaradas
lhes arreavam as cal-
ças à força e os atiravam para cima da mulher.
Na taberna o Abel tinha passado para trás do balcão, a
mostrar a confiança: 
– Vossemecê vai? 
O taberneiro demorou a responder: 
– Não prestam. E apanhas uma galiqueira que nunca mais tem cura."
….
In O Rebate 
 
