Resmunga o Eduardo que esteve a fazer contas, passaram meses e na sua ideia a coisa não pode durar,
não aguenta, porque já nem é senhor em sua casa, tudo gira em volta do Fernando,
o irmão mais novo da Idalina, que há anos vive em New Jersey e num fim de tarde,
como se fosse grata surpresa, sem aviso lhes bateu à porta, anunciando que
vinha por uns tempos até que se resolvesse um caso e ficaria com eles enquanto
não encontrava poiso.
Vão correndo os meses, o cunhado está de pedra e cal,
o Eduardo desabafa com um ou outro, jura que se lhe acabou a paciência, um dia
destes ou vai ou racha, mas pelas caras que lhes vê e a maneira como encolhem
os ombros sabe que não acreditam, devem suspeitar que as razões são outras, pois
um tipo com dinheiro - se é verdade o que consta - não
se iria sujeitar a viver com eles num acanhado rés-do-chão.
O caso é que “o americano” não somente se sujeita,
como dá a impressão de que tudo corre a seu contento, fazendo-se apaparicar pela
irmã, mandando nela com perrices de miúdo. Uma tarde confessou-lhe que tinha
voltado por ter havido problemas com o divórcio da Marilyn, mas assim que
tivesse o processo arrumado ia-lhes mostrar o que era a gratidão.
Abraçou-a muito, disse que nunca esqueceria o que
estavam a fazer por ele. Ainda pensara em ir para um hotel, só que não podia
suportar que lhe voltasse a faltar o carinho da irmã, que sempre tinha sido uma
verdadeira mãe. E a propósito, esquecera mas dizia-lho agora: como não tem
filhos, se um dia lhe acontecer alguma desgraça são eles os únicos herdeiros, e
nem precisarão de mexer uma palha, lá na América os advogados tratam de tudo.
Eduardo ouviu-a aos bufos, sacudindo a cabeça, perguntando-se
se a mulher estava em seu juízo ou a precisar de óculos. Então não via que o pelintra
não tinha onde cair morto? Que o que estava mesmo a pedir era um pontapé e rua
com ele?
Desde aí, assim que o marido chega Idalina não sai do lado
do irmão, a temer o pior, porque nem olha para eles, deixou de lhes falar, não vem
comer a casa nem a quer na cama – fosse dormir no sofá ou com o “Nandinho”.
- Que se aborreça por causa do meu irmão, até sou capaz
de compreender, mas por essa da cama vai pagar, ó se vai, e com língua de palmo.
Que a coisa não fica assim, nem é ele o único a mandar, agora as mulheres
também são gente. Nunca discuti nem lho fiz sentir, para evitar arrelias, mas
esse tempo acabou, já não é como quando se dizia que quanto mais uma pessoa se
abaixa mais se lhe vê o cu.