Há
colegas que juram que a inspiração existe, outros confiam mais em esquemas,
outros ainda escrevem seguindo um plano, há-os também que recusam falar no seu
método de trabalho. Método não tenho, até agora quase sempre parti duma ideia
ou de vagos contornos de cenas ou maneirismos de personagens. Depois, umas
vezes a coisa vai indo, noutras simplesmente empanca, descarta-se então o
trabalho feito e, com tempo e sorte, lá volta a ocasião de recomeçar.
Mas durante
quase sete décadas de escrita anotei dois casos que para mim continuam uma
incógnita, perguntando-me por vezes se estava bom da cabeça. No primeiro houve
uma única frase que literalmente, e em momentos inesperados, me perseguiu
durante anos. Quando finalmente a usei no começo de um romance, foi como se a
sequência do que escrevia me fosse ditada, facilitando a construção do enredo.
O
segundo caso foi mais bizarro, pois comecei o romance por uma cena que se dava
a meio da narrativa, sem ideia de como aquilo ia continuar, nem em que direcção,
menos ainda qual seria o remate da história. Mas ao fim tudo deu certo, e ambos
os romances foram bem recebidos.
Um texto
publicado pela revista Granta no número da Primavera de 2000, e que só há pouco
li, trouxe-me o alívio de saber que o meu caso não era único, nem a minha
cabeça ameaça desandar.
Diana
Athill foi durante muitos anos redactora dos romances de V.S. Naipaul na editora
André Deutsch, certamente bom escritor, mas indivíduo intratável e picuinhas em
extremo. Conta ela : « In 1975 we received the thirteenth of his books – his eighth work
of fiction – Guerrillas. For the first time I was slightly apprehensive
because he had spoken to me about the experience of writing it in an unprecedented
way: usually he kept the process private, but this time he said that it was
extraordinary, something that had never happened before: it was as though the
book had been given to him.”
Grande alívio.