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Sou um dos milhões a quem a Pátria, mãe
desleixada, entregou na Roda dos Expostos, deixando a outra o cuidado de me dar
mantença e garantir uma vida com deveres, direitos, justiça e dignidade.
Essa vida tem sido a minha, desde que há
cinquenta e sete anos cheguei ao Reino dos Países Baixos. Não me vejo a
agradecer, nem a Holanda de mim o espera, pois faz cada um de nós o que deve:
cumpro eu os deveres, garante ela os direitos, o bem-estar, a legalidade. Não
agradeço, mas admiro e invejo.
Agora que, dois dias mais, a Rainha Beatriz
vai abdicar, e o seu reinado foi de muita dedicação aos interesses da res publica, de sincero cuidado e carinho para com os seus súbditos, magoa-me dobrado fazer a comparação e, para
só falar dos da Terceira República, não poder dizer o mesmo dos chefes de
estado, dos primeiros-ministros, dos governantes que violam a pátria que nos é
madrasta, a pilham desavergonhadamente com artes de cavalheiros de indústria,
nos dão mau nome e irreparável prejuízo, a nós e aos que hão-de vir.