sábado, julho 31

Orgia aldeã

 

"O Bártolo tinha dito que as vira descer a ladeira, as mesmas do ano passado e mais duas que não conhecia, novas, com roupas de cidade, todas pintadas!
– Estão além do palheiro.
Encolheu os ombros porque ainda não se atrevia e afinal também era cedo, os músicos nem sequer estavam no coreto.
– A mim é que elas não apanham – disse o cabo de ordens.
– Com a escarmenta do ano passado...
– O Zé já lá está metido!
Falavam por falar, à espera da noite, precipitando-se logo quando o Marques abriu as portas e os deixou entrar, carrancudo, nem que lhes fizesse favor, medindo os copos em silêncio.
O Grande, sentado no chão, tonto porque não parara de beber desde manhã, encostara-se à mulher e ressonava.
– Já cá venho há três anos a fio, mas é terra pobre. Vinte mil réis, trinta... Este deu-me duas notas o ano passado, mas também... Cruzes! Ainda bem que está com o vinho! – A rapariga acendeu o cigarro com cautela por causa da palha, depois cuspiu no fósforo.
– Se é assim!
– Há os outros.
– Onde é que se dorme?
– Aqui. O que é que tu querias?
A porta chiou e o vulto recortou-se um instante, passou para dentro.
– Quantas somos? – perguntou ainda a rapariga.
– Cinco. Se a Micas vier.
O homem sentou-se junto delas, sem uma palavra, o luar que entrava pelas frinchas mal dava para ver.

– Quem começa?
– Eu, então. – E dirigindo-se a ele: – São cinquenta.
Estendeu a mão e riscou um lume para examinar a nota.
– Vamos lá.
O Manuel levantou-se, agoniado porque lhe vira a face, a querer recusar-se:
– Eu fui com vossemecê o ano passado. Mais quero a rapariga.
Ela continuou a caminhar por entre as faixas, não dando importância, sem se voltar.
– Vem, se queres.
E ele foi, dócil, ajudando-a a estender a palha no chão.
Dinheiro perdido. Quando se pôs em pé quase tropeçou no que esperava, outros atrás, o palheiro cheio, reconhecendo--se, mas sem uma fala, as mulheres ocupadas, ofegantes os que
se apressavam, os rapazotes num canto, medrosos ou paralisados, alguns deixavam passar a vez e saíam, davam uma volta, entravam de novo, até que os camaradas lhes arreavam as cal-
ças à força e os atiravam para cima da mulher.

Na taberna o Abel tinha passado para trás do balcão, a mostrar a confiança:
– Vossemecê vai?
O taberneiro demorou a responder:
– Não prestam. E apanhas uma galiqueira que nunca mais tem cura."

….

In O Rebate