quarta-feira, novembro 20

Nótulas (33)

Nos momentos em que por qualquer motivo me inclino para a introspecção, dou-me conta  que desde o começo a minha vida tem sido uma curiosa mistura de altos e baixos, com a particularidade que, duma maneira ou doutra, algumas das ocasiões desfavoráveis resultam num improvável benefício.
Assim é que, armado com essa experiência, tenho aprendido a não ter repentes, a pacientar nos juízos, a dar vez à opinião alheia, fazendo quanto posso para não cair em dogmatismos ou cegueiras, nem me deixar arrastar por paixões.
No plano pessoal tem-me vindo daí paz do espírito, algum optimismo, e viveria sossegado não fosse o caruncho do amor ao meu país e à minha gente, que me atacou por volta dos quinze anos, foi crescendo, é hoje a razão maior das minhas sombras e mortificações.
Dá-me pena, mas não posso alinhar com os entusiastas da onda de benefícios que o turismo, a mais aleatória das indústrias nos traz. Menos ainda com os que se sentem felizes e honrados com as peneirices de uma Web Summit, de startups e semelhantes, se vejam já a pedir meças a Silicon Valley. Também me ensombra que sejam tantos os estrangeiros super-ricos que de súbito descobrem Portugal, isso pela simples razão de que nem a nossa sociedade nem os nossos políticos – tantos deles reconhecidamente corruptos – dispõem de experiência ou meios para fazer frente ao poderio e às consequências dessas riquezas. E os nossos ricos, mesmo os que aparecem na lista da Forbes, não são quem para com eles competir.
O Zé Povinho, esse continuará onde todos os reis e políticos esperam e querem que se mantenha, e a classe média, a classe que é a espinha dorsal dos países prósperos e civilizados, vai descobrir que o seu destino repete o dos que nos anos cinquenta e sessenta deitaram a fugir, porque a Pátria era madrasta. E continua a sê-lo. Os seus filhos e netos serão os próximos “vacanças”.