Que a Literatura não vai pelo
caminho que nos meus sonhos eu gostaria de vê-la ir, é preocupação que por
certo só aflige os que pela idade ou pelo estudo dispõem das referências que
lhes permitem esse passatempo.
Todavia, verdade é que quanto
mais leio e estudo, mais vezes me pergunto por que carga de água os romancistas
à volta do mundo julgam poder competir com os jornais e a televisão, e assim
que há tragédia, revolta, crise política, cataclismo, pouco demora a que não
apareça romance com essas desgraças por pano de fundo, o que a mim me deixa com
a impressão de um refogado de má e dispensável culinária.
Chernobyl, Twin Towers, a guerra
dos Balcãs, a do Iraque, a do Afganistão, o terramoto no Haiti, os refugiados, todas
essas desgraças e muitas outras têm os seus romances, mas devo confessar que o
que disparou este meu arrazoado foi a leitura de Girl, um romance da talentosa
e respeitável Edna O’Brien (1930), como que decalcado na tragédia das
raparigas da Nigéria raptadas e escravizadas em 2014 pelos jihadistas do Boko
Haram.
Li, não apreciei, os jornais e a
TV deram-me na altura drama bastante, dispensava o enredo, tanto deste nosso
infeliz tempo, da rapariguinha que sofre o cativeiro, mas consegue escapar aos
seus algozes com o recém-nascido nos braços e vai ser mal recebida pela família.
Seja como for arrisco uma
profecia: Edna O’Brien, tem talento reconhecido, uma obra importante, idade avançada, é mulher, bons ingredientes para o próximo Nobel da Literatura.