Tive isso com as palavras desde que aprendi a ler. O sentimento de magia e mistério, o assombro de com elas criar, mudar, torná-las arma de arremesso, dar-lhes a leveza clássica da pluma ou da aragem; mentir com a verdade, criar um mundo, uma batalha, uma tragédia, soprar vida nos mortos.
Esse sentimento durou, parecia tornar-se segunda
natureza, poder de varinha mágica, mas o tempo tudo muda, e se o assombro que
as palavras me causam permanece, tenho ideia de que já não sou eu quem as
invoca, nelas manda e eventualmente força, são elas que agora se impõem, me tornaram vassalo, ditam a ordem
e o andamento, me levam a aceitar que possa haver alguma verdade na afirmação
pessoana de que "o poeta a si assiste".
Alguma. Provavelmente diminuta, talvez apenas a precisa
para confundir, mas insuficiente para confirmar.