Antes que você comece a fazer juízos precipitados, deixe-me explicar. Num longínquo passado li o "Ullysses" de Joyce. Levou tempo, deu trabalho, canseira, e os aborrecimentos de me ver confrontado com o muito que não sabia. Mas valeu a pena e alguma coisa aprendi. "Grande Sertão Veredas", de João Guimarães Rosa, custou muito menos a ler, mas deu-me algo que "Ullysses" não podia dar: o encanto de ver enriquecida a língua mãe e o transporte a um mundo mais familiar.
E assim me acontece de vez em quando, simples acaso, pego num livro que me interessou, folheio aqui e ali, releio uma página, outra, outra ainda, vem-me a alegria de redescobrir. Mas não vá pensar que gasto os meus dias a ler Montaigne. O caso é que, com um gesto desastrado fiz cair uns livros e ao repô-los vi-me com o segundo volume dos "Essais" na mão. Leitura dos anos sessenta que não me apetece repetir, pois aquele francês do século XVI, mesmo quando acomodado à modernidade, exige demasiado da minha paciência.
O livro caiu aberto na página 515, li, disse comigo que muito mudam os tempos e os costumes. Nessa página discorre Montaigne sobre Júlio César, conta que estando este a parlamentar com Ariovisto, chefe dos Suevos, se deu conta de uma manobra errada do exército inimigo. Se agisse nesse momento teria certa a vitória, mas preferiu ignorar a vantagem, de medo que o pudessem acusar de que tinha procedido de má fé.
Ainda haverá generais como os do meio século antes de Cristo?
