sábado, outubro 18

Escrevendo

Ainda que nele se evitem revelações ou intimidades, o diário permanece um instrumento perigoso.

Não para quem o lê, mas para o seu autor. Uma espécie de testemunha muda que conhece os pensamentos que originaram as palavras, conhece até ao detalhe as razões que levaram a filtrá-los, e a cada momento ameaça que, se quiser, pode apresentar queixa no tribunal.

O tribunal da consciência, entenda-se. Aquele que em geral desdenha do direito de defesa e passa sentenças sem apelo.

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Mesmo o leitor das obras de ficção anseia por encontrar nelas uma certa dose de verdade. A dificuldade reside em que, na sua essência, a verdade se revela quase sempre banal, rotineira.

Por isso o escrever, ao contrário do que por vezes se pensa, não é uma forma de mentir, mas a melhor maneira de, através do enfeite, tornar a verdade aceitável e atractiva. Transformá-la de seco conceito moral em obra de arte.