Tinha-o apontado na agenda: segunda-feira dezassete, por volta das cinco da tarde. Se acontecesse o pior poderia informar o médico do momento em que tinha começado aquela tosse seca que lhe tirava o ar.
Conseguiu manter a calma, e sexta à tarde o exame foi um alívio: nada de grave, uma irritação dos pulmões, enfraquecidos por anos a fumar demais. Logo passaria se tivesse cuidado, e durante uns dias ficasse em casa.
Esse “durante uns dias” vai em sete meses, porque se a tosse passou, sofre desde então de um acumular de sentimentos desencontrados, que ora o fazem cínico e triste, para de seguida ser acometido por medos que lhe desgastam a resistência. Fecha-se no quarto, proibindo que a mulher o incomode e até, o que já aconteceu umas três vezes, dizer-lhe que durma no quarto que era do filho, depois explicaria. Mas a explicação não veio, nem ela se arrisca a pedi-la, porque da vez que lhe lembrou a promessa o viu reagir como se tivesse perdido a cabeça.
Demorou a acalmar e finalmente, embora com o modo agastado que às vezes é o seu, explicou que não se sentia bem, aquilo eram nervos, havia de passar. Então D. Zinha, julgando que dava um bom conselho, sugeriu que em vez de ficar em casa à espera de melhoras, talvez fosse preferível consultar um psiquiatra, um… Ó palavra que disseste! Felizmente, ao contrário do que esperava o marido manteve-se calmo, pelo menos na aparência, exagerando até a lentidão com que se levantava. e voltando-lhe as costas desapareceu no quarto.
É de louco, dirão os insensíveis, e talvez seja, mas à força de tanta notícia de guerras e tragédias, ao pobre Severino resta uma certeza: pode metade do mundo escapar aos vírus, micróbios e infecções que andam por aí, mas ele foi marcado, a sua hora não tarda. Aquela tosse seca e os pulmões sem ar foram mais do que um aviso.