«CRAVOS
DE RENTES. Que dizer deste 'Cravos e Ferraduras' (Ed. Quetzal) que
acaba de saír, da autoria de J. Rentes de Carvalho ? O nonagenário
escritor dá-nos um retrato a cru da paisagem portuguesa: vidas sombrias
numa província desconhecida, pintadas em histórias breves que fazem doer
e ferem como farpas (ah, o derradeiro conto !).
É
um livro que só na aparência lembra os contos de 'Os Lindos Braços da
Júlia da Farmácia'; estes são menos humorosos, menos piedosos, mais
cáusticos... Parecem pedaços saídos de 'O Meças' (livro por alguns
mal-amado, mas admirável).
Lemo-los
com o prazer de sentir o estilo depurado de Rentes mas com esse amargo
crescente que só poucos sabem põr a nu, um amargo que dilacera, conto a
conto: mas é mesmo verdade que também somos assim ?
Não,
não é um livro para férias (como era o citado), e sim um grande fresco
lusitano cheio de turbulências, onde quase todas as personagens
escolhidas não merecem mesmo a nossa piedade.
Rentes
de Carvalho (n. 1930), cidadão do mundo com raízes transmontanas,
continua a ser o romancista de referência, o admirável contador de
histórias que só ele sabe dizer em sínteses sem rodeios e em que a
simpatia não precisa de estar presente.
Num
país de grandes poetas, surge por vezes um enorme escritor: é o caso,
mil vezes demonstrado nos últimos trinta anos desde que, de obscuro
escritor luso-holandês, passou a ser conhecido e aclamado em
Portugal...»