Além das mais que conhecidas, desagradáveis e previsíveis consequências que a acompanham – sei do que falo - a muita idade possui de vez em quando uma ou outra que inesperadamente se manifesta, parecendo ter como única finalidade, o desequilíbrio de certezas que se julgavam adquiridas, mas de um instante para o seguinte, felizmente passam à categoria de fata morgana.
É provável que de uma ou outra maneira sempre tenha sido assim, mas creio – de facto tenho a certeza – que para a geração que me antecedeu, e vivia em circunstâncias que em pouco se diferenciavam das do século dezanove, a máquina a vapor, a electricidade, o automóvel, a rádio e o telefone eram incríveis maravilhas.
Nesse ditoso tempo, nem mesmo o mais destemido dos visionários teria ousado imaginar a importância, o impacto, a profundidade do transtorno causado no nosso dia-a-dia. Decorre isso da verdadeira omnipresença e omnipotência, do que já não é somente aparelhagem, mas nos transcende. Funciona em clouds, “nuvens” que na aparência existem para nosso uso e benefício, mas na realidade perturbam o entendimento, levando-nos a escorregar para a situação de escravos de um incorpóreo, mas assustadamente totalitário e poderoso senhor.
Sorrirão divertidos, pensando diferente, os que têm agora à volta dos trinta, certos de que quando chegarem à velhice não vão ser apanhados de surpresa pela modernidade que lhes calhar. Convencidos de que, venha o que vier, será sempre para melhor, mais sofisticado, proveitoso e acessível a todos.
Porque chega de sombras, e já foram ultrapassadas as suas profecias, serei o último a recomendar-lhes a leitura de O admirável mundo novo de Aldous Huxley.