Desde que não prejudique o semelhante, nem o aborreça demasiado, cada um tem direito às suas crenças, bizarrias, certezas e toleimas. Mas onde, de modo em extremo desagradável a porca torce o rabo, é quando se tenta determinar o limite aceitável entre o que parece um assalto de boas intenções, mas na realidade pode ser a ingénua arrogância de quem, indiferente à irritação ou à vontade do outro, insiste em ajudar.
Isso acontece demasiadas vezes com aqueles, que chegados ao que eufemisticamente se chama “certa idade” - o meu caso - se vêem sujeitos a um bombardeamento de bons conselhos, avisos, sugestões, “pírulas”, técnicas e processos que asseguram a saúde, o bem-estar, a agradável passagem do tempo. Todos com certificado de garantia, não somente travam de modo radical o envelhecimento, mas também contribuem para melhorar a qualidade do dia-a-dia, aumentando ainda o gosto de viver.
Felizmente, e para seu descanso, não lerá isto a boa alma que me trouxe o frasco que tenho agora defronte. A acreditar no papelucho anexo, a eficácia dos cem compimidos foi provada pela pesquisa feita a setecentos e setenta e sete suíços idosos, que depois de tomarem diariamente um grama de ácido gordo ómega-3 constataram, de modo irrefutável, ter sido retardado em três ou quatro meses o seu envelhecimento biológico.
Assim será. Já não rio, não sorrio, não gracejo, encolho os ombros, deixo andar. Mas essa é a aparência, certo e seguro que ninguém poderá dar conta da fúria que escondo no íntimo. Fúria que vai tanto para os intrujões e as suas promessas, como para os simples, que acreditam esconder-se nas pílulas destas ou de outras vitaminas, a certeza de dias calmos e o milagre de uma saudável longevidade.