quarta-feira, setembro 15

A roda dos cavalinhos

 

Porque rebrilha de luzes e cores, tem música, gira muito mas não sai do sítio, a quem como eu a vê de longe a política nacional lembra a roda dos cavalinhos: os animais mantêm-se firmemente aparafusados e insensíveis, a garotada que os monta bem pode espicaçar, mas é   jogo, aquele galope uma ilusão. E porque do ‘nobre povo’ do hino parece não se esperar mais do que bata palmas como a claque nos teatros, acusam-se de não compreenderem a realidade os que julgam o espectáculo deprimente.

Mas pensem os outros como quiserem e pareça eu azedo em comparação, a verdade que salta aos olhos é que não somente o jogo político em Portugal denota grande refinamento, como é inegável que os nossos políticos, por escasso que seja o seu preparo e duvidosos os diplomas com que alguns se enfeitam, manobram eles nas repartições, nos ministérios e na Assembleia da República com uma virtuosidade de ilusionistas.

Há quem zombe da sua falta de cultura e garanta que são poucos os que abrem um livro, mas suspeito que, bem ao contrário, os que dão nas vistas pela  habilidade, se nunca ouviram falar de A Arte da Guerra de Sun Tzu, de O Príncipe de Maquiavel, ou os fecharam ao perceber que aquilo ultrapassava o seu entendimento, sabem de cor e salteado páginas inteiras de O Conde d’Abranhos, de Eça de Queirós. Porque não somente encontram aí os princípios imutáveis por que se guia a política nacional, como vêem confirmado que a estratégia que seguem lhes garante o sucesso:

‘O sistema da violência foi abandonado como inútil, e começou, com êxito, o dúctil método da habilidade… Em vez de bater uma forte patada no País, clamando com força: - Para aqui! Eu quero! – os governos democráticos conseguem tudo, com mais segurança própria e admiração da plebe, curvando a espinha e dizendo com doçura: - Por aqui, se fazem favor! Acreditem que é o bom caminho!... Tal é a tradição humana, doce, civilizada, hábil, que faz com que se possa tiranizar um País, com o aplauso do cidadão e em nome da Liberdade… Eu, que sou governo, fraco mas hábil, dou aparentemente a soberania ao povo, que é forte e simples. Mas, como a falta de educação o mantém na imbecilidade, e o adormecimento da consciência o amolece na indiferença, faço-o exercer essa soberania em meu proveito… E quanto ao seu proveito… adeus, ó compadre!’

Vêm aí as eleições e dói a certeza de que, embora fortes e simples, continuaremos indiferentes, moles, pasmados com a fantasia da roda dos cavalinhos, que gira sem sair do sítio.

------

Só mais duas semanas para confirmar.