domingo, março 11

À espera da vida

(Hong-Kong - clique para aumentar)
Pouco a pouco foi descobrindo que a vida, a sua vida, é uma longa espera. Tempo infindo esperou os namoros que não teve, os amantes que a arrebatariam de paixão, os beijos que não deu nem recebeu. Esperou as horas loucas que tantos vivem, e depois longamente contam, indiferentes à melancolia de quem os ouve.
Uma manhã deu-se conta de que esperava menos. A falar verdade teve o sentimento de que deixara de esperar, e estranhou, sentiu-se vazia, desorientada, como se tivesse perdido um hábito ou lhe faltasse um arrimo.

Aos doze anos queria ser bailarina, aos dezassete matriculou-se em Medicina. Mudou para Economia e Sociologia. Doutorou-se aos vinte cinco. Durante um ano trabalhou na Bolsa de Londres. Passou dois em Nova Iorque, como investment banker, dois num banco de Hong Kong – "Nada de excepcional, sair do trabalho às quatro da manhã e às nove voltar ao escritório" -  e de novo em Londres com o mesmo ritmo.
Aos pais, à irmã, e a duas pessoas por quem tinha amizade, escreveu a mesma carta, falando da sua desilusão e da tristeza de não ter compreendido a vida. Tinha trinta e dois anos. Foi  ontem o enterro.