quarta-feira, fevereiro 4

Estevais (Mogadouro) - Amsterdam

Para amizade e a boa vizinhança não há horas, e assim às seis e meia da manhã estão eles e elas à porta. Ajuda daqui, mala dali, beijos, abraços, adeuses e outra vez adeuses. O jovem Noronha arranca, com a calma que o torna excepção entre os ases do volante. Passamos Moncorvo e Vila Flor ainda a dormir, em Mirandela, por volta das oito, surpreendem os cafés cheios de gente, muitas mães e crianças num pequeno-almoço que pelos jeitos não sofre demora.

Neve no Alvão. Vila Real de través. Moinhos tolos e parados no alto da Campeã. Mais neve no Marão, de seguida os monótonos quilómetros que passam por Amarante, pela Maia e acabam nas “Partidas/Departures”.

Estranho espectáculo o de um aeroporto amplo, bonito, moderno, eficiente, onde àquela hora se conta menos que uma centena de pessoas.

O controle não é de graças nem atenções: tira-se o cinto, caem as calças, voam os sapatos, erguem-se os braços, faz favor de pôr os pés aqui e agora faz favor de se virar.

A bordo do TAP para Lisboa a hospedeira deve sofrer de jetlag e anuncia um voo de cinquenta e cinco minutos. Os passageiros resmungam, ela corrige para trinta cinco. A cortesia do pedido de desculpa não pertence às instruções.

Corrida na Portela à procura da Porta 17. Aí em vez de Amsterdam está Madrid. Insisto, mostro o bilhete, a funcionária encara-me com a rispidez de quem supõe bebida forte. Mas com um dedinho no ar e o outro a soletrar morosamente Amsterdam no teclado, lá consegue descobrir que mudaram a porta para 14.

Avião cheio. Com voz grossa e marcial, This is your captain speaking informa que espera turbulência forte logo depois da descolagem. De facto assim é, só que a bexiga manda mais. Vou correr para os lavabos do Airbus 320, lá longe na cauda, mas a hospedeira aprendeu luta livre, agarra-me, manda que me sente e, como se eu não me desse conta, grita que há turbulência. Pois há, minha linda, mas retenção de urina, bexiga infectada, os rins a doer, não és tu que me páras, nem o Diabo.

Aterragem em Schiphol com muita neve. E o formidável e engenhoso aparelho, que consegue o milagre de voar, anda quase meia hora por ali às voltas e reviravoltas como um qualquer autocarro ronceiro.

Chamam o meu nome. Vejo-me defronte duma jovem despachada que aponta um carrinho eléctrico. Senta-se a minha mulher, sento-me eu, o foguete arranca, passa por umas catacumbas, apanha a bagagem, acena à Polícia e aos aduaneiros, sobe, desce, deixa-nos num escritório onde nos espera – Ó Holywood dos excelentes seguros holandeses que, quando a gente se vê em apuros, não o fazem por menos – uma limousine!

O chofer arranca a caminho de casa e já agora quer saber se sou português. É que português não fala, mas além das línguas correntes desenrrasca-se em árabe, turco, russo, grego japonês, um bocado de mandarim...

Antes das boas-noites aconselha-me que não esqueça de ir o médico. Porque não é só línguas. De bexiga e rins sabe ele mais do que muito especialista.