domingo, dezembro 8

Venha o Dilúvio

 

Seria despropositada arrogância, a do Zé-Ninguém que, ao sofrer uma derrota, se quisesse comparar a Luís XV, desejando o fim do mundo com as enchentes bíblicas do Dilúvio.

Quando as coisas nos correm mal, ou saiem às avessas, as mais das vezes encolhemos os ombros. Porém, se o azedume leva a melhor e perdemos as estribeiras, costumamos escolher uma das expressões em que o verbo mandar serve de muleta verbal, remetendo o que ou quem nos incomoda, para inúmeros, mas sempre desagradáveis destinos.

A grande dificuldade está, então, em decidir se os mandaremos para a merda da fossa, as labaredas do Inferno, as Urgências, o útero infame onde foram gerados, ou em busca de um genital viril que satisfaça, sabe Deus que fraquezas, vergonhas, ou desejos recalcados.

Pessoalmente, e desde há demasiado tempo, aborrecem-me os aflitos com o aquecimento do planeta, os que exigem uma agricultura “natural”, os tontos que chamam assassinos aos talhantes. E paro aqui, porque nos momentos em que cedo à irritação que me causam as soluções disparatadas que essa gente propõe, também não resisto – em pensamento – a mandá-los para os mais variados, e nem sempre bem cheirosos destinos.

Isso não só pela evidente tontura, mas por se tomarem por elite, destinada a indicar o caminho certo ao povinho ignorante, e esse que aguente, pague, agradeça a bemfeitoria, continue como esperam que se manenha: de joelhos, e mão estendida.

De qualquer modo, mesmo os de fraca cabeça dão-se conta de que, por muito que temam o aquecimento da Terra, também esperam que ela os não surpreenda, e de um dia para o outro, rebentando pelas costuras, desate a soltar vulcões, se transforme numa colossal frigideira onde nós todos, diminutos que somos, desapareceremos ainda antes de sermos fritos.