Tão firmes se sentem os fanáticos nas suas certezas, que argumentar com eles é tempo mal gasto. Alem disso, o que por vezes parecia simples cavaqueira, ameaça então terminar aos berros e insultos, de modo que o mais avisado é fazer de surdo, ou deitar água na fervura, em caso nenhum cair na asneira de continuar a discussão.
Agora que abundam as circunstâncias de escolher campo, não vejo cómico que consiga ser tão divertido como um fanático. Não desses fanáticos que torturam e degolam, mas o fanático em versão simplória, como o do futebol ou dos Rolling Stones, e sobretudo o da política, filiado em partido. Esse endeusa tudo, mas mesmo tudo o que o partido decide, certo e seguro que o líder trilha o caminho exacto, só ele está na posse da milagrosa bússola que, sem falha nem desacerto, invariavelmente aponta para o norte das decisões sábias, das medidas certas, necessárias para o bem-estar e felicidade geral.
Diverte-me em particular o fanático que, sem falsa modéstia, se considera perspicaz e inteligente, porque esse deixa aperceber na vida política, sobretudo nas estratégias e medidas que o seu partido recomenda, possibilidades idênticas às de um dia se conseguir realizar a quadratura do círculo, a Coreia do Norte aliar-se aos Estados Unidos, ou encontrar prova do monstro de Loch Ness ser lampreia extraterrestre.
Entre as minhas relações conto dois desses extravagantes, mas não há indiscrição em revelá-lo, e perigo de perder a sua amizade também não corro, pois mesmo se me desse para lhes gritar que são tarados, eles nem por sombras acreditariam.
É que o fanatismo, e o da política partidária é felizmene dos mais mansos, tem por vezes isso de maravilhoso: causa uma cegueira igual à das grandes paixões que nas óperas se contam e cantam.