sábado, janeiro 18

É como na política


Oiçam, porque ele é que sabe, esteve lá, não lhe venham com cantigas. O Canadá não é o que dizem, o Canadá não presta, os nossos aguentam aquilo porque acham que cá é pior, mas não é. A América sim, aí às vezes é mesmo escravatura, direitos só tem o patrão, se refilas ou te queixas dão-te um pontapé naquele sítio e goodbye, estás na rua. Há quem diga  que a  Austrália é um bocadito melhor, e de facto têm razão, mas nada que se compare com as plataformas do petróleo ou o Dubai, porque se os “arábias” são uns merdeiros ali há massa que nunca mais acaba.
Não lhe falem da Inglaterra nem da Escócia, na Alemanha aguentou dois meses mas não volta a pôr lá os pés, nos dezoito anos que anda a soldar pipelines como poucos sabem fazer, até na Grécia trabalhou, o caso é que nunca viu gente tão chata como os alemães, basta olhar para aquelas cabeças e fica tudo dito.
O Carlos veio de férias, descanso mais que merecido para quem aguentou cinco meses na África do Sul, país de que também não quer ouvir falar e aonde nunca voltará, mesmo que lhe dobrem a paga e hospedem em hotel de luxo, porque sair do táxi e ver um carapinha que te encosta a pistola aos queixos e quer a carteira, é experiência que não vai esquecer tão cedo. África do Sul? Vá pra lá quem estiver cansado da vida.
Com o balcão, seis mesitas, televisão, os matraquilhos e uma esplanada onde cabem três cadeiras, o café da Elisabete fará encolher os ombros à gente de cidade que por acaso passe por aquele buraco de poucas almas e longe de tudo, mas essa impressão logo desaparece se for altura em que o Carlos lá se encontra numa das suas visitas relâmpago, pois com  espalhafato, a voz forte e aquele modo de ilusionista, mal começa é como estar num teatro, alguns dizem que se os da televisão soubessem como o rapaz sabe falar e dos sítios por onde andou já o tinham contratado.
Esses que o Carlos deixa de boca aberta com as suas vivências de soldador, mais se espantariam se ele lhes contasse as vezes que, ainda rapaz, assistiu a orgias nos cruzeiros dos milionários que querem dar a volta ao mundo em três meses de luxo e grande pândega.
O que acontece é que, sabe-o ele por intuição e experiência, nem todos os públicos mostram  interesse pelas mesmas histórias: os que já têm querem sonhar com gozos, aos precisados fala-lhes de ganhos. Mas um detalhe continua a surpreendê-lo, o de que o acreditem, ninguém peça explicações. É como na política: quanto mais exagera nos benefícios mais eles se deixam hipnotizar.