Chamaram-lhe amor, mas foi apenas sexo, uma graça do Senhor, milagre que durou anos e eles, abismados, se perguntariam depois porque tinha acontecido.
Do primeiro momento guardavam a lembrança: tinham ido com um grupo a uma casa de fados, ambos os únicos estrangeiros, estranhando o ambiente, a melancolia da música, a estridência das vozes, desconcertados com os arrepios que sentiam, incapazes de destrinçar o que era paixão verdadeira do que era espectáculo.
Os braços tocaram-se ao acaso de pegar nos copos. Sorriram. Ele sussurrou qualquer coisa que se perdeu no ruído do aplauso, ela julgou responder dizendo que sim, também estava a gostar, achava impressionante.
Imóvel, tensa, quando ele lhe segurou o ombro; depois, um momento, os dedos muito leves a deslizar na nuca, surpresa ao dar-se conta que o braço a deixava.
A luz voltou a diminuir. Recordam que demorou horas, saíram para o hotel num estado hipnótico, silenciosos, de mãos dadas. Eles que só desde a tarde se conheciam.
Não houve palavras, hesitações, surpresa ou fingimento: ele abriu a porta do quarto e ela entrou.