Estou quase certo que é um pensamento a que poucos escapam. Levado pela proximidade dos festejos do nascimento em Belém, andei mais dias do que o razoável a remoer a ideia, dizendo-me como, dentro do espírito natalício, seria agradável distribuir cumprimentos a uns quantos. Este e aquele, gente conhecida, anónimos que me divertem, com quem tenho aprendido, e por vezes me levam a rever a justeza de alguns dos meus cavalos de batalha. Fui anotando nomes e compondo uma lista, com a ideia de, a partir de anteontem até ao final do ano, diariamente assinalar alguém que, por razões várias, me parecesse merecer atenção.
Ainda bem que, acalmado o entusiasmo, e recordando Henry David Thoreau (1817-1862) autor que bastante contribuiu para a minha formação na adolescência, encontrei nele a razão de não levar a ideia por diante. Porque de facto, quem raio sou eu, que autoridade me dou para distribuir cumprimentos? Afirma esse meu antigo mentor: "Compliments and flattery oftenest excite my contempt by the pretension they imply; for who is he that assumes to flatter me? To compliment often implies an assumption of superiority in the complimenter. It is, in fact, a subtle detraction." (Devido à pretensão que implicam, os cumprimentos e a lisonja provocam muitas vezes o meu desdém; pois quem é esse que supõe poder lisonjear-me? Cumprimentar implica com frequência uma pretensão de superioridade por parte daquele que cumprimenta. É, de facto, um subtil desapreço).
E já agora uma anotação em rodapé: durante a sua vida Henry David Thoreau foi um quase desconhecido, mas como tantas vezes acontece, uma vez morto e enterrado descobriram ser ele uma das figuras mais relevantes da Literatura americana do século dezanove.