Na minha idade, a morte próxima, tenho
horas em que faço contas, revejo sonhos, listo aspirações. Em primeiro
lugar o desejo de que a minha morte não seja súbita. Quero tempo para me
despedir dos que amo, dos amigos que tenho, horas para recordar os que me
fizeram bem, ensinaram caminhos e abriram horizontes.
Quero tempo para rememorar e
agradecer a minha vida, aventurosa, variada, rica de paixões, de fúrias,
alegrias, negrumes, amores, alturas e precipícios, e que por vezes, como que
fora de mim, iluminou o palco e me fez espectador privilegiado do espectáculo.
Quero horas para me despedir do pobre
país em que vim ao mundo. Relembrar que o amei como se fosse gente, me senti menino acarinhado e feliz no seu regaço. Que dele aprendi a língua, única no modo de embalo, aquela que para lá do
sentido das palavras deixa entrever os mistérios da música e do eterno.
O
país da suavidade, do desespero, dos sonhos infantis, das mãos pobres que um
nada enche, do sofrimento envergonhado e amanhãs que nunca chegam.
Irei
sem perdoar aos que o rebaixam.