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Com o título "Gastos de energia" este texto é de Maio do ano passado. Repete-se agora, porque na vida é cansativamente muito o que se repete.
Gasta-se muita energia a esquecer, a fingir, a perdoar, a
manter a calma quando a vontade era o par de bofetadas, o desdém, virar as
costas, mudar de passeio. Gasta-se muita energia a manter a aparência de paz e
harmonia, a fechar os olhos e os ouvidos, a passar a esponja, a diminuir a
fúria ou a escondê-la, a fazer de conta que se compreende, que se aceita,
inventando desculpas, deitando mão de provérbios e sorrisos, explicações tolas,
das diferenças de idade, que os mais novos pensam diferente porque não viveram
aquilo, não estavam lá, falta-lhes experiência.
Assim fosse, mas assim não é. A estupidez, a arrogância,
a segurança dos juízos, a justeza do ideal, são de todas as idades. Como o é a
lamechice do amor aos pobrezinhos, aos injustiçados, aos famélicos da Terra; o
êxtase do folclore revolucionário, desde que sejam outros a sofrer e a morrer,
e a revolução não venha desarranjar o que tanto custou e tão agradável torna os
dias.
Gasta-se muita energia a viver num mundo de conformidade
em que, como alguém escreveu, "as pessoas constantemente se tocam e se
beijam, falam dos seus problemas como se assim pudessem descrever o mistério da
vida, ou negar o caos que ela é… um mundo em que, cada vez mais, o risco é
calculado e, na medida do possível eliminado, dando lugar a um mundo novo,
brando, no qual a visão do preparo de comida se torna mais emocionante do que a
leitura de um poema".
Gasta-se muita energia a tentar compreender, a aceitar a
riqueza da vida.